7h38 – Empoeirado, o relógio marcara o tempo que não passava para ele. Ele, ali, sentado naquela velha – e, também, empoeirada – cadeira.
Não havia motivações, não havia vontade. Raios, não havia nada! Nada que despertasse interesse de levantar-se dali. Nada. Nem mesmo a incessante dor que se apossara do seu estômago e que, como sempre, continuava a ignorar
(...)
Silêncio.
7h38 – Observando
uma trilha de cascas (de amendoins) e cascos (de cervejas, oras), lembrara que não
arrumava o apartamento há uns quatro dias. Quatro dias? Não mesmo, talvez duas
semanas – que se foda, pensava; afinal, não recebia ninguém há tanto tempo.
Pensando bem, recebia sim: o cara da pizza (que era mais fina que suas canelas;
barata, contudo) ou, simplesmente, o ‘cara’.
Quantos
‘caras’ ele já não havia recebido naquele apartamento?! “Felicidade instantânea,
pequeno garoto”, dizia um dos primeiros. “Que merda. Que grande merda”,
pensava.
Bem,
os anos passaram-se e seus ‘favoritos’ mudaram – assim como os ‘caras’ e,
também, ele mesmo. Com seus 30 anos, estava velho, largado e doente. Um cara terrivelmente
doente. Assim que sua mãe o chamara quando ameaçou não visitá-lo e, inclusive,
não telefonar mais.
7h38 – “Haviam tantas cores naqueles tempos”, refletiu. Agora, no entanto, só havia o cinza das pontas de cigarros largadas sobre a mesa. Ah, havia também o branco do pó – tão alvo quanto sua pele – que ainda não havia inalado. O espelho estava próximo.
E
o sangue escorria, aos poucos, de seu braço - no osso que um dia fora um braço,
melhor. Mais um provável abscesso para estampá-lo. Contudo, naquela reflexão
doentia, o sangue cedia mais uma cor. Sua vida era monótona, mas não tão
monocromática como pensava.
(...)
Dor. O estômago doía, sua alma gritava, o braço sangrava e, agressivamente,
vomitava... ora um rubro ainda mais forte que o de ferimento, ora um alvo mais
branco que seu braço – e, também, mais forte que os restos dos flocos de neve
sobre o espelho.
7h38 – Tinha, de uma vez por todas, largado a cadeira. Rastejando sobre dejetos e lixo, procurava o telefone. Tolice. Não havia pagado a conta. Não havia pagado nada nos últimos meses, na verdade. Ainda engatinhando, o suor escorria no chão e a respiração ofegava – seriam os seus últimos momentos? Ainda lutando, alcançou... o relógio.
Finalmente
percebeu que o objeto estava quebrado. “7h38?! Foda-se”, pensou e tentou
gritar. Em meio ao devaneio, conseguiu olhar a janela e notou que chovia... e
muito. Alegrou-se por pode perceber, por poder sentir algo. Algo que não fosse
dor. Ainda olhando a janela, viu homens fardados... e irritados – um deles
batia a porta ininterruptamente. De forma doentia, aquilo o alegrava. (...) De
repente, o relógio não marcava mais 7h38: o led
havia apagado, a luz havia sumido. Ele estava sob o que um dia havia sido e, de
mãos abertas, sobre o chão.
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Layne Staley: 22/08/67 – 05/04/02 |
PS: Este texto é um pequeno conto (ou seja, fictício) em homenagem ao vocalista original do Alice in Chains, o icônico Layne Staley. Para o pequeno tributo, boa parte do conteúdo foi baseado em letras, pertencente a fase de Staley, da clássica banda norte-americana de grunge.
Músicas:
Alice in Chains – Angry Chair (Dirt, 1992)
Alice in Chains - Junkhead (Dirt, 1992)
Alice in Chains - Sickman (Dirt, 1992)
Alice in Chains - Nutshell (Jar of Flies, 1993)
Alice in Chains - Nothin' Song (Alice in Chains, 1995)
Legal a homenagem, muito boa mesmo!
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