quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Resenha: Opeth - Heritage

Ano de lançamento: 2011
A discografia dos suecos do "Opeth" é marcada pela ousadia e rompimento de barreiras dentro do, muitas vezes preconceituoso, nicho musical a qual pertencem, o heavy metal. Na obra do grupo, passagens acústicas, nuances psicodélicas e demais elementos, característicos da música progressiva, harmonizam-se, normalmente em uma mesma composição, com passagens de gêneros mais extremos da música pesada - como o death, black e doom metal

Tal mistura sempre atraiu admiradores, como também afastou ouvintes - que não simpatizavam com alguns elementos presentes do grupo. Todavia, em meio a essa "salada de influências musicais", algo sobressai-se na música do Opeth: a imprevisibilidade. Esse atributo costuma marcar desde a estrutura das canções, até as letras e a capa de um disco da banda.


"Heritage" fora anunciado como um álbum a parte, provocando um certo furor na mídia especializada. Uma das declarações, feitas por Mikael Akerfeldt (líder do grupo), era de que, tal como "Damnation" (2003), o vocal gutural - um dos principais elementos da música do Opeth - não estaria presente em nenhuma das faixas desse disco. Contudo, diferentemente de "Damnation", o foco desse trabalho voltaria-se, principalmente, a música progressiva como era produzida nos anos 70 (ano que marca o ápice criativo do estilo). 

Um fato que marcou - e preocupou os fãs - foi a saída do tecladista Per Wiberg logo após a gravação do álbum. O motivado da saída, alegado pelo músico, foi de que ele gostaria de tocar sua própria música. A faixa-título, que abre o disco, curiosamente foi a única faixa em que Per não contribuiu no trabalho. Cortesia de seu substituto (Joakim Svalberg) a bela peça, baseada no piano, introduz ao primeiro single do disco, "The Devil's Orchard".

Já conhecida de alguns, antes do lançamento do disco, "The Devil's Orchard" é uma das faixas mais "tradicionais" desse trabalho, possui ótimas variações e um riff principal que é tão original como, na mesma proporção, grudento. Influências de bandas como "Camel", "King Crimson", "Jethro Tull" e até "Yes" seguirão até o fim do disco... e essa é a faixa mais próxima do "Opeth" tradicional - se é que é possível traçar um limite de "tradicionalidade" para a música do grupo.

 A próxima canção ("I Feel the Dark") é uma das melhores. Sabe aquele tipo de música que melhora a cada audição? Essa é uma delas. A passagem mais pesada pode ser curta, mas é a 'cereja no topo do bolo' aqui. Já a quarta faixa ("Slither") é uma das músicas mais diferentes do disco e da carreira do "Opeth". Trata-se de uma homenagem ao falecido vocalista Ronnie James Dio (ex-Black Sabbath, Rainbow) e mescla elementos de grupos de rock setentistas, como o próprio "Rainbow". Infelizmente, a composição destoa demais das outra canções, soa fora do contexto, como um 'b-side' perdido dentro do álbum. Nem o clássico, e belo, final dedilhado aproxima ela do contexto do disco.

"Nephenthe", "Haxprocess" e "Famine" seguem com o clima progressivo do ínicio do álbum, porém aliando elementos jazzísticos e psicodélicos em suas fórmulas. A última citada é uma das umas das músicas mais ousadas já produzidas pela banda, contando, inclusive, com a presença de flautas. Porém, nesse ponto a audição do álbum, perigosamente, pode tornar-se cansativa.

"The Lines in My Hands" destaca-se pelas excelente linhas de bateria  e imprisivilidade em si, excelentes solos de violão a enriquecem bastante essa música que é uma das mais curtas do disco e da carreira da banda, famosa por faixas enormes. A próxima música ("Folklore") possui uma forte veia jazzística e experimental no geral - até mais que no resto do álbum - e soa agradavelmente psicodélica. Um dos destaques, com certeza.

 Tal como foi introduzido, o álbum encerra-se, também, com uma faixa instrumental. "Marrow of the Earth" é uma das melhores, mais bonita e melancólica canção instrumental já composta pelo "Opeth". A riqueza de influências aqui é enorme. Não há o que comentar, apenas ouça!
 
Sim, Mikael Åkerfeldt não mentiu em nenhuma de suas declarações: "Heritage" é um álbum a parte, mas não apenas na discografia da banda, e sim na música contemporânea no geral. Explico: não se trata de um disco composto para ser apreciado, por exemplo, enquanto o ouvinte realiza diversas outras tarefas, ou escuta em algum fone pela rua - ao menos não recomendo nas primeiras audições. No geral, é um álbum complexo, com pouquissímos elementos de heavy metal - o que vai desagradar fãs puristas - e com canções difíceis de serem absorvidas de primeira. 

Enfim,  "Heritage" vai contra a maré de toda a música descartável tão perpetuada na atualidade. Confesso que demorei para compreendê-lo e foi dificil resenhá-lo, pois precisei de algumas e, introspectivas, audições para entender a obra em sua totalidade.

Claro que este disco trará novos apreciadores ao grupo, mas a chance de provocar uma resposta negativa, infelizmente, é ainda maior. "Heritage" é complexo desde sua capa - existe muito simbolismo por trás das imagens, vale a pena "estudá-la" -, até a última nota de "Marrow of The Earth". Mas a melancolia, a introspecção e o experimentalismo - mais do que nunca - tão característico da música do "Opeth" estão presentes. Todavia, quem esperar um "Still Life" (1999) - épico, agressivo e metal - ou até mesmo um "Damnation" - acessível, melodioso e depressivo - quebrará a cara. 

Apesar de ter gostado desse experimento, secretamente - agora, não mais - aguardarei o regresso das guitarras incrivelmente distorcidas e dos guturais.

Nota: 8,0

Músicas-chave:
"Folklore" ; "I Feel the Dark" ; "Marrow of The Earth"



Formação:

 Mikael Åkerfeldt - vocais e guitarra
Fredrik Åkesson - guitarra
Martín Méndez - baixo
Martin Axenrot - bateria
Joakim Svalberg - teclado

Tracklist:

1.     Heritage     02:05      
2.     The Devil's Orchard     06:40
3.     I Feel the Dark     06:40
4.     Slither     04:03
5.     Nepenthe     05:40
6.     Häxprocess     06:57
7.     Famine     08:32
8.     The Lines in My Hand     03:49
9.     Folklore 08:19
10.     Marrow of the Earth 04:19

 *Esta matéria também pode ser vista em:
http://whiplash.net/materias/cds/139354-opeth.html

3 comentários:

  1. Na época do lançamento, escrevi assim:

    A espera acabou. Três longos anos se passaram desde o lançamento do aclamado “Watershed” e o Opeth volta a surpreender com outra obra-prima. O disco “Heritage”, que chega ao mercado no dia 20, pode ser um divisor de águas na carreira do grupo sueco, tanto para o bem, como para o mal. O genial Mikael Åkerfeldt, líder da banda, mergulhou de cabeça nas suas influências e entregou um trabalho ousado, que deve confundir os fãs e conquistar quem ainda não teve o prazer de ouvir o quinteto.



    O Opeth emergiu do underground para uma grande gravadora como a Roadrunner por não ter limites. A mistura da rispidez do death metal com a sonoridade melancólica do folk e do experimentalismo do rock progressivo foi sendo lapidada aos poucos, desde a estreia com “Orchid”, em 1995. O som característico do grupo, que pode ser bestial e melodioso em uma mesma canção, foi modificado no seu DNA em “Heritage”. Mikael dispensou os vocais guturais, algo completamente inusitado vindo de um cantor como ele.



    “Heritage” é um belo exemplo de como a música tem o poder de encantar as pessoas. É um disco triste, daqueles capazes de deixar o ouvinte sem chão, tamanha a perfeição do seu conteúdo. Se esse trabalho fosse gravado pelos dinossauros do King Crimson ou pelo Camel, uma das bandas preferidas de Åkerfeldt, seria, sem dúvida, um marco na história moderna do rock progressivo. É um álbum complexo, difícil de digerir, mas torna-se indispensável após algumas audições. Quando achamos que não há nada mais a ser inventado, o Opeth consegue inovar (como sempre).



    Obra-prima



    O disco abre com a faixa-título, uma peça instrumental de dois minutos tocada com primazia pelo pianista Joakim Svalberg, substituto de Per Wiberg, que gravou todas as outras nove faixas desse trabalho, mas deixou o grupo após oito anos. Heritage estabelece logo nos primeiros segundos o clima sombrio que impera nesse álbum. É belíssima, soa como algo do grande Jan Johansson, a lenda do jazz escandinavo.



    The Devil’s Orchard, primeiro single de “Heritage”, tem uma levada esquisita, quase de jazz, graças ao baterista Martin Axenrot, que já figura entre os melhores do estilo, com uma performance impressionante. Com inúmeras reviravoltas, a música traz uma letra carregada de pessimismo, em que Åkerfeldt murmura sobre um Deus que está morto e exalta o esplendor da escuridão.



    Em canções como I Feel the Dark fica evidente como o disco é fragmentado. São vários temas dentro da mesma música. Passagens acústicas que se transformam em pesados e macabros riffs de guitarra, e vice-versa, tudo valorizado pela produção cristalina do também genial Steven Wilson (Porcupine Tree). Slither, em homenagem ao falecido Dio, ex-vocalista do Black Sabbath, é mais agitada que as demais, para não dizer alegre, e parece fora de lugar em meio à atmosfera lúgubre criada pelo Opeth.



    Surpresa



    O destaque absoluto de “Heritage” fica para a longa Famine, a única com participações especiais. O percussionista peruano Alex Acuña (Weather Report) faz uma introdução tribal, que cede espaço para o show particular de Åkerfeldt, que sem a dose cavalar de urros, demonstrou ser um grande vocalista. Mas a surpresa da música está na flauta de Björn Lindh, que transforma tudo em um Jethro Tull com esteroides. Simplesmente espetacular. “Heritage” é candidato a melhor disco do ano, sem dúvida.

    também tenho um blog, porém abandonado: www.esteticamusical.blogspot.com

    me manda um e-mail. vamos conversar sobre música. abraço

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  2. Teu texto ficou excelente, Daniel. Inclusive, ao ver o teu comentário, reli essa minha postagem e, hoje em dia, mudaria muita coisa desse texto... É legal ver sua própria evolução - ou não - em meio a tantos posts. (:

    Enfim, por qual motivo abandonastes teu blog? Ele é (era?) ótimo, cara. Bem, tu não deixou teu email... dê uma sacada no meu ali na parte de contatos. Qualquer coisa, basta falar. (:

    Abraços... e obrigado pelo comentário.

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  3. como já dito, esse álbum precisa ser escutado algumas vezes para ser compreendido. opeth como sempre inusitado :p

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